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Atabicar o Caminho

Um audiowalk para Guimarães (2013)

Com partida na Plataforma das Artes e da Criatividade, Atabicar o Caminho é uma intervenção sonora sobre um percurso de exploração da envolvente urbana do Rio de Couros, cruzando e unindo alguns dos seus espaços singulares, entre as antigas propriedades das Dominicas, onde se instalaram o novo espaço da Feira Semanal e do Mercado Municipal, a jusante, e o núcleo central da Zona de Couros, a montante. Este projeto, desenvolvido em contacto com indivíduos e comunidades que, de formas diversificadas, habitam, usam e conhecem este território, pretende refletir sobre a natureza dos processos de evolução da cidade.
Um passeio de natureza imersiva, sobre um percurso invulgar, que cruza diferentes visões e relações, na construção de um objeto artístico que se assume como “uma companhia sonora para caminhantes solitários”(1).

Conceção e criação: João Martins
Apoio à dramaturgia: Nuno Casimiro
Interpretação (voz off): Pedro Carreira, com participação especial de Ana Vitorino e Tommy Scanlon

Uma encomenda e produção do Serviço Educativo de Guimarães, Capital Europeia da Cultura

(1) O formato audiowalk, com este “mote”, foi inicialmente desenvolvido em Portugal pela companhia de teatro Visões Úteis, com a colaboração de João Martins.

As cidades são, antes das casas, das ruas, ou das praças, os locais onde nos juntamos. Onde paramos e nos tornamos verdadeiramente gregários: escravos do território que julgamos explorar. Ou que exploramos mesmo.

São os sítios das biografias colectivas, dos conflitos pequenos e grandes, domésticos e públicos.

São mais do que a soma do que somos, porque são também o que nos subtraímos e os milagres e os desastres da divisão e multiplicação de recursos e malfeitorias que fazemos ou deixamos fazer.

São o que espalhamos à nossa volta nesse momento de parar e dizer: “é aqui”. É aqui que nascemos, é aqui que morremos.

A Ribeira de Couros atravessa a cidade de Guimarães em regime de apneia. Ouvimo-la resfolegar debaixo das ruas, vemo-la ser engolida pelos edifícios, sabemos que, desde tempos imemoriais, as “gentes de luta e labor”— dos curtumes e não só—, canalizaram e canibalizaram a Ribeira e sobre ela construíram os espaços do trabalho e da vida.

A cidade fora da cidade, fora do perímetro muralhado, com cheiros e vidas que não juntavam ao útil, o agradável, encosta-se nas margens da ribeira. Sobre ela se debruça e pousa as suas estruturas. Bebe a água que nasce na Penha e é com ela que alimenta a terra e o trabalho e é sobre ela, também, que despeja os seus desperdícios.

Sim, é o “merdário”, esta ribeira que se esconde debaixo das ruas e das casas, mas é também com ela que se lava a roupa nos tanques públicos e se regam os campos, da Penha até à Veiga de Creixomil.

Junto ao novo Mercado Municipal— onde o vento faz ranger as lonas e se ouve uma catatua—, a ribeira reencontra o ar e, por breves instantes, interrompe a sua prolongada apneia.

Em alguns dias, a cor da água, sugere que, algures, entre a Penha e a cidade, alguém lava toda a roupa de Guimarães nesta água. Imagino um tanque gigantesco e braços fortes a esfregar séculos de fraldas e lençóis da nação que nasceu de uma disputa familiar.

(Um filho e uma mãe desavindos terão sempre muita roupa suja para lavar.)

Mas logo a água se some, engolida por estruturas seculares— o Brecht diria qualquer coisa sobre tudo isto, com certeza— e as voltas que damos à procura desses assomos da água, ensinam-nos os caminhos de Couros e das quintas que se haviam de plantar nestas margens até à Veiga de Creixomil, onde as águas já só desperdício, já só fedor, se haviam de aliviar e purificar na rega dos campos.

É também nesta violência sobre as águas que se desenha e define a cidade; nesta mistura de exploração exaustiva e controlo obsessivo que faz nascer casas que engolem a ribeira.

Na rua onde se planta um Centro para os Assuntos da Arte e Arquitectura, um Mercado e uma Feira, a ribeira circula, em contra-mão, algures debaixo de nós.

Canalizada e posta ao serviço da indústria, em tempos, que corrente é esta agora? O que traz e para que serve?

Imagino os “rápidos” na escuridão total deste ventre pós-industrial.

E aquela árvore solitária? Há quanto tempo está a olhar para nós?

João Martins

Texto publicado no jornal LURA, n.º 24, abril a julho 2013.

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Biométricos Rua (última semana)

Esta é a última semana para experimentar a 1ª parte da 44ª criação do Visões Úteis: Biométricos Rua.

Até ao dia 1 de junho, o público pode dirigir-se ao Espaço Montepio, na Avenida dos Aliados, e requisitar um smartphone que contém a aplicação “Biométricos Rua”. Cada espetador é então desafiado a escolher um percurso para ligar um conjunto de Estações obrigatórias, espalhadas pelo centro do Porto. Para concluir o desafio, deverá validar os códigos QR Biométricos que aí encontrará. O percurso é monitorizado por GPS e condiciona a banda sonora ouvida a cada momento.

Existem pontos extra que podem ser obtidos validando códigos específicos nos locais assinalados no mapa: Pontos de Esforço, em trechos que implicam especial esforço físico ou desvios ao percurso mais direto, e Pontos de Calma, onde a localização dos códigos é obtida mediante especial atenção às indicações fornecidas na banda sonora.

Se concluir o desafio, o espetador poderá inscrever o resultado da sua performance num ranking onde o tempo de realização do percurso e o total de pontos recolhidos determinarão a sua posição.

Não há um percurso lógico, não há uma velocidade certa. É o espetador que escolhe o caminho e o grau de esforço físico que quer dedicar ao desafio.

Biométricos Rua – 17 de maio a 1 de junho / Espaço Montepio
Avenida dos Aliados nº90, das 11h às 17h (horário da última saída)

Coprodução: Visões Úteis / Fundação de Serralves; Apoio Financeiro: Porto Lazer

  • Direção: Ana Vitorino, Carlos Costa e João Martins
  • Cocriação: Inês de Carvalho
  • Leitura Vídeo: Alexandre Martins
  • Imagem: João Martins / entropiadesign
  • Coordenação de Produção: Marina Freitas

Biométricos Rua

  • Concepção e interface da aplicação, banda sonora original e sonoplastia: João Martins
  • Programação: Óscar Rodrigues (Digitópia/Casa da Música)
  • Textos: Ana Vitorino, Carlos Costa e João Martins e entrevistas com Alexandre Viegas, António Fonseca, Conceição Martins, Ester Alves e Isabel do Carmo
  • Interpretação: Ana Vitorino, Carlos Costa, Inês de Carvalho, João Martins, José Carlos Gomes e Marina Freitas e ainda Alexandre Viegas, António Fonseca, Conceição Martins, Ester Alves e Isabel do Carmo

Com citações de Alberta Lemos, Carlos Sá, Filippo Tommaso Marinetti, Hugo Ball, La Fontaine por Curvo Semedo e Marion Bartoli. A banda sonora inclui registos de ensaio do NEFUP, de situações em contexto de trabalho e desporto, e um excerto da transmissão de uma partida de ténis entre Michelle Brito e Maria Sharapova.

 

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A escola da escolha

Começou nesta semana, no dia 15 de Abril, um período especial para todos os pais e encarregados de educação de crianças que no próximo ano lectivo irão frequentar o 1º ano de escolaridade: a escolha da escola onde irão passar parte significativa dos seus próximos 4 anos de vida e onde irão adquirir e aprofundar um conjunto alargado e fundamental de competências— o ler, escrever e contar, mas também o brincar e jogar, o experimentar, o partilhar…— e, assim, crescer.

As expectativas que cada um de nós tem para si e para os seus filhos, o contexto onde estamos inseridos, a teia mais ou menos complexa de relações que constitui o processo de educação de uma criança… todos estes factores podem transformar este período num momento de maiores ou menores angústias. Já não vivemos em aldeias, mas sabemos muito bem que a educação de uma criança convoca tanto a participação racional como emocional de quem a rodeia e aos seus pais. E sabemos também que, no que às “escolhas” diz respeito, entre o cardápio e os singulares mecanismos de oferta e procura, nem sempre as primeiras escolhas podem ser satisfeitas, mesmo num período de “escassez” de crianças. Ou podem?

Com informação e alguma ponderação, podemos, em Aveiro, chegar à conclusão de que não há razão para parte das eventuais angústias.

Em Aveiro, dentro da cidade— das suas freguesias ditas urbanas—, há 4 estabelecimentos do 1º ciclo do ensino básico por onde escolher: Barrocas, Glória, Santiago e Vera Cruz (por ordem alfabética). E estes 4 estabelecimentos fazem todos parte do mesmo Agrupamento de Escolas que, desde o ano passado, tem sede na Escola Secundária Homem Christo e do qual fazem parte, também, o Jardim de Infância e a EB1 de S. Jacinto e a única escola do 2º e 3º ciclo do ensino básico destas freguesias: a Escola João Afonso.
Fazerem parte do mesmo agrupamento não significa que sejam iguais, obviamente, mas significa, logo à partida, que partilham um conjunto alargado de recursos técnicos e humanos e que são, quer ao nível técnico, pedagógico e científico, quer ao nível da gestão, enquadradas numa estrutura centralizada que garante uniformidade de processos e níveis de exigência comuns no seu funcionamento. E para aumentar essa relação estreita entre estas escolas, desde o ano passado, as escolas da Glória e Santiago partilham até o seu coordenador.
Os resultados escolares, aferidos por indicadores internos e externos comprovam precisamente esta uniformidade dos processos de ensino-aprendizagem, com médias muito próximas entre todas estas escolas nos exames finais do 1º ciclo, um indicador que terá a sua importância para alguns pais e encarregados de educação.

No extremo oposto desta “uniformização virtuosa”, que apresenta como equivalentes todas estas escolas, temos o estado das instalações de cada um dos estabelecimentos e o historial recente de intervenções a que foram submetidas ou que estão em curso. Essa é uma responsabilidade da autarquia, como sabemos. E, infelizmente, nem todos os processos têm sido geridos com o mesmo nível de sucesso.
Quanto à qualidade das instalações e intervenções recentes na Glória, Santiago e Barrocas podemos e devemos tentar aferir nos locais e com guias informados (pais, professores, funcionários) o que foi feito, como tem funcionado e que tipo de problemas pendentes existem.
(No que à Vera Cruz diz respeito, podemos e devemos consultar o projecto e pedir informações a quem de direito acerca dos prazos de conclusão das obras e dos procedimentos adoptados para minorar estes impactos.)

Neste capítulo, de facto, as escolas são bastante diferentes. A que conhecemos melhor, Santiago, depois de concluídas as obras, é um bom exemplo de um centro escolar com todas as valências fundamentais:

  • o novo Jardim de Infância, onde se juntam agora as crianças do Jardim de Infância de Santiago, com as do Jardim de Infância de Aveiro, que funcionou no edifício do Conservatório de Música de Aveiro Calouste Gulbenkian até ao ano lectivo passado, tem tido um desempenho notável e reconhecido por todos;
  • a Biblioteca adquiriu novo fôlego, por via da renovação das instalações e da nova professora bibliotecária, que organiza actividades para todas as crianças, incluindo as do pré-escolar, e para as famílias, numa demonstração clara de uma das vantagens do Agrupamento— o funcionamento em rede das bibliotecas escolares;
  • o novo Refeitório acolhe e serve um maior número de crianças, divididas em grupos (pré-escolar e 1º ciclo), com a mesma qualidade dos restantes equipamentos, assegurada por via da concessão a privados, determinada pela autarquia;
  • as salas de aulas recuperadas, assim como as novas salas de aulas estão equipadas e prontas a acolher até 10 turmas do 1º ciclo do ensino básico, com computadores, video-projectores e, em geral, as condições de conforto necessárias a uma escola actual;
  • os espaços adicionais, para experiências e reuniões, permitem diversidade de actividades e boas condições de trabalho para os professores;
  • o recreio foi expandido de forma significativa, e está equipado com 2 campos de jogos protegidos, um deles partilhado com a comunidade, fora dos tempos lectivos;
  • mantêm-se áreas cobertas de recreio e o ginásio/polivalente permite o desenvolvimento de várias actividades, alimentando-se a esperança de que possa ainda vir a ser melhorado.

Evidentemente, não estamos perante uma escola ou um centro escolar perfeito e aqui, como noutros locais, devemos ser exigentes e identificar as áreas onde é necessária intervenção adicional, mas o que não podemos negar é a evidência de que, neste momento, o centro escolar de Santiago é o melhor centro escolar da cidade, do ponto de vista das instalações. E essa visão é partilhada não só pelos responsáveis do Agrupamento e da Autarquia, mas também por representantes dos pais e encarregados de educação das diversas escolas.

Mas, Santiago não é a melhor escola, de facto. Porquê?
Com estas instalações e integrada numa mesma estrutura que as restantes escolas, este facto é de difícil explicação. O problema não são as instalações, como se torna evidente numa visita aos vários complexos. Nem os resultados escolares, como uma consulta aos relatórios do Agrupamento e às estatísticas dos exames nacionais permite confirmar.
Santiago não tem a melhor escola, neste momento, simplesmente porque tem, ainda, salas vazias. Das 10 salas de aula disponíveis, apenas 6 albergam turmas, sendo 2 delas, uma solução provisória para a escola da Glória.
E estas salas vazias são motivo de vários tipos de inquietação e incómodo:

  • como gerir eficientemente os recursos do Agrupamento de Escolas de Aveiro, face a esta situação onde algumas das melhores instalações estão vazias, estando outras sobrelotadas?
  • não seria um caminho óbvio para aumentar a qualidade dos processos de ensino-aprendizagem na escola de Santiago, maximizar a sua ocupação, considerando que mais turmas, significam, além de mais alunos, mais professores, mais funcionários, mais recursos, em geral?
  • com vantagens económicas para o erário público associadas a vantagens pedagógicas tão evidentes, o que justifica esta situação?

Esta última pergunta, que já se justificava antes das obras de expansão e requalificação, e ganhou nova pertinência, tem, ao longo dos anos, encontrado sempre a mesma resposta: os pais, no momento de inscrever os seus filhos, não escolhem Santiago.
Mas essa resposta deve suscitar uma nova pergunta, imediata: porquê? Que razões objectivas podem justificar que, neste contexto que descrevemos, um pai ou encarregado de educação considere que Santiago não deve ser opção para o seu filho ou educando?
Não são as instalações, não são os processos de organização ou supervisão técnica e pedagógica. Não são sequer os resultados.
Dizem-nos que o problema será o contexto da escola, o ambiente que a rodeia. Ou melhor, a “percepção pública” desse contexto. Fala-se de um “estigma” associado a Santiago que, aparentemente, justificaria que pais e encarregados de educação não a considerassem uma alternativa válida às restantes escolas da cidade.
Quase invariavelmente, quem refere esse “estigma” apressa-se a distanciar-se do preconceito que atribui à “opinião pública”. Como é fácil de perceber, um preconceito tão frágil e pouco informado como este, não resiste a nenhum tipo de confronto com a realidade.

De facto, a Escola de Santiago tem uma localização privilegiada sob vários aspectos:

  • paisagisticamente, fica encaixada no Parque de Santiago que se organiza de acordo com a grande mancha verde que atravessa a cidade e inclui o novo Parque da Sustentabilidade;
  • urbanisticamente, articula-se com uma zona maioritariamente habitacional, com vantagens óbvias do ponto de vista de usos, quer para a Escola, quer para a envolvente;
  • no que aos acessos diz respeito, está simultaneamente protegida de vias de trânsito automóvel rápido e a poucos metros de uma das principais entradas da cidade e das artérias relacionadas, tendo também capacidade para absorver o trânsito específico da escola, com paragens e estacionamentos breves, sem distúrbios de maior para a cidade;
  • a localização permite organizar saídas a pé, com toda a segurança e conforto para zonas e equipamentos como o Parque da Sustentabilidade, o Conservatório de Música, a Fábrica da Ciência, o Estaleiro Teatral, o Campus da Universidade, o Mercado de Santiago, etc, em experiências muito ricas para as crianças;
  • a prevalência da função habitacional na proximidade, assegura laços com a comunidade que enriquecem a escola e contribuem positivamente para a sua segurança.

E a lista de vantagens prossegue.

"eu adoro o nosso bairro", dizem as crianças da Escola de Santiago
“eu adoro o nosso bairro”, dizem as crianças da Escola de Santiago

Mas esta comunidade territorialmente mais próxima não assegura um saldo demográfico que ocupe todas as salas da escola e, como acontece em toda a cidade, numa das conquistas mais relevantes da escola pública e democrática, a comunidade escolar é enriquecida com crianças das mais diversas proveniências, criando um ambiente diversificado, propício a todas as aprendizagens.

Por isso, todos nós que conhecemos a escola de Santiago e para quem ela é a escolha óbvia, temos dificuldades em lidar com as suas salas vazias. E sabemos bem o prejuízo que estas salas vazias representam para todos os envolvidos mas, especialmente, para os alunos da escola de Santiago.
Porque sabemos que mais crianças, mais turmas e, assim, mais professores e mais funcionários, farão da Escola de Santiago o que ela pode ser: a melhor escola da cidade. Com benefícios para todos.
E porque sabemos também que o único obstáculo a esse crescimento é a informação e educação de quem terá que fazer, agora, a escolha de uma escola para os seus filhos e educandos.

Por isso propomos que, antes de fazerem a escolha da escola, frequentem a escola da escolha: informem-se, visitem as escolas, falem com os responsáveis do Agrupamento e da Autarquia, com professores, funcionários, alunos, pais e encarregados de educação.
Não deixem que lugares comuns, por muito que sejam repetidos e, por vezes, por gente que devia pensar duas vezes antes de os repetir, condicionem indevidamente uma escolha tão importante para os próximos 4 anos da vida das nossa crianças.

Escolham livremente, mas sempre em consciência.

Aveiro, 17 de Abril de 2014

João Martins
membro da direcção da Associação de Pais da EB1 e Jardim de Infância de Santiago
membro do Conselho Geral do Agrupamento de Escolas de Aveiro

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Esta rua não é só um número, apresentação

“Esta rua não é só um número” é uma peça de arte sonora comunitária: um esforço colaborativo para desenhar um mapa que se ouve, uma cartografia sonora.
Em oficinas com crianças, adultos e séniores, (re)aprendemos a ouvir com todos os sentidos e também com a memória, para procurarmos as paisagens sonoras, os eventos e os estados de espírito que constroem a identidade do lugar.
Estas paisagens incorporam registos mais objectivos, como gravações de campo, entrevistas e testemunhos, registos mais subjectivos, como as interpretações musicais de locais ou eventos e materiais híbridos, construídos a partir da manipulação dos registos.
Partilhámos mapas feitos de locais e percursos habituais, preferidos e imaginários e a a sobreposição destes mapas (re)constrói uma cidade que podemos ouvir, em fragmentos, distribuídos pelos diversos pontos de difusão da peça.
Nesta difusão fragmentada, há elementos comuns, estruturais e há grupos temáticos, que constituem a identidade específica de cada um dos locais de difusão. Mas há também excertos de percursos e narrativas que têm continuidade noutro local e que convidam à circulação e ao jogo de encaixar peças de um puzzle sempre incompleto.
Em cada um dos locais de difusão coexistem materiais diversos: ambientes públicos em difusão geral, testemunhos pessoais, em micro-altifalantes e materiais que exigem uma escuta mais atenta, em auscultadores.

“A casa”

Na Casa Alves Ribeiro, no espaço protegido das garrafeiras, sentamo-nos e pensamos na dimensão pessoal e íntima da cidade. Falamos sobre as suas fronteiras e sobre a relação com o exterior. Ouvimos confidências. Confrontamo-nos com o passado da vila e com o seu crescimento.
Estamos protegidos.

“O corredor”

No famoso corredor da Aipal, recriamos fragmentos dos circuitos familiares nocturnos da cidade de Espinho e pensamos na sua história. Pensamos no “picadeiro” e na Avenida 8 e, aproveitando a forma característica do espaço, reflectimos também aqui sobre a relação de Espinho com o comboio, ao longo do tempo.
Estamos de passagem.

“A pesca”

A cafetaria Conde Ferreira, instala-se no edifício da Junta de Freguesia de Espinho, que é também posto de turismo, e convida-nos a desfrutar da esplanada. Entre estes interiores e exteriores acompanhamos fragmentos do ciclo da pesca. Ouvimos o mar e as redes e pensamos nas origens piscatórias do lugar. E, já que aqui estamos, deixamos a praia entrar mais um pouco.
Estamos ao sol.

“A feira”

Em toda a sua calma, a casa de chá 20 Intensus, fica bem perto do centro da maior agitação da cidade. Pensamos na feira de Espinho e no ritmo semanal que impõe. Comparamos o seu funcionamento com a natureza do espaço que ocupa e visitamos a feira, mas visitamos também o vazio criado pela sua ausência.
Estamos só a ver.

“A circulação”

A posição da Perles de Chocolat, na Rua 23, permite-nos observar o sobe-e-desce da cidade, no seu ritmo constante de actividades complexas. Reconstruímos os ritmos diversos e as funções que fazem a vida da cidade. Pensamos nos locais de trabalho e nos locais de lazer. Na circulação.
Estamos a fazer uma pausa.

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Esta rua não é só um número

O meu próximo projecto intitula-se “Esta rua não é só um número” e está a ser criado para Espinho, no âmbito do Festival do Norte.

Podem ver mais detalhes no site do festival e acompanhar algum do trabalho de campo no blog. Em breve, hei-de escrever mais qualquer coisa acerca deste projecto e de outros, sobre os quais ainda não disse nada aqui no blog, como o audiowalk para Guimarães, “Atabicar o Caminho”.

Para já, estou muito entusiasmado com os resultados da oficina de “audiografias musicais” com a Banda de Música S. Tiago de Silvalde e gostava muito que ouvissem este exemplo:

Audiografias Musicais na Banda Musical S. Tiago de Silvalde
Improvisação dirigida por João Martins. Fotografia de Luis Barbosa / Festival do Norte.

Neste exercício de improvisação dirigida, participam:

[Clarinete] Carla Pinto (17 anos), Mariana Matos (9 anos), Miriam Pereira (8 anos), Leonardo Pereira (11 anos)
[Flauta Transversal] Mariana Silva (10 anos), Anabela Costa (17 anos)
[Trombone] Paulo Teixeira (10 anos)
[Trompete] Mafalda Ferreira (11 anos), Diogo Aleixo (11 anos)
[Saxofone] Patrícia Carvalho (13 anos), Mariana Teixeira (14 anos), Carlos Pereira (15 anos)
[Violino] Gonçalo Fortuna (10 anos)
[Percussão] Flávio Oliveira(10 anos), Marco Aleixo, (14 anos)

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Grândola, uma cábula útil para os dias que correm

Para reler e refrescar a memória. Ninguém precisa de ficar só a trautear.

Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade
Dentro de ti, ó cidade
O povo é quem mais ordena
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada esquina um amigo
Em cada rosto igualdade
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada rosto igualdade
O povo é quem mais ordena
À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade
Jurei ter por companheira
Grândola a tua vontade
Grândola a tua vontade
Jurei ter por companheira
À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade

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É provável

… que este blog fique mais ou menos fechado para obras durante uns tempos.

Preciso de fazer umas actualizações de fundo e, como este ano de 2013 tem muitas novidades importantes, terei que encontrar uma nova estrutura capaz de dar o conveniente destaque aos projectos em curso, separando-os, de alguma forma, das entradas mais genéricas, pessoais e/ou familiares.

Não faço ideia quando é que voltarei, nem que aspecto terá a coisa, mas hei-de voltar.

Até.

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Mega Picnic da Sustentabilidade – Aveiro

MEGA PICNIC DA SUSTENTABILIDADE - Aveiro | Venha aproveitar os nossos espaços verdes! Escolha um dia e convide a família e amigos para um picnic num dos maravilhosos estaleiros que o Parque da Sustentabilidade instalou por toda a cidade. É só escolher! Rossio, Alboi, Baixa de S.to António, Parque Infante D. Pedro.  QUEREMOS OS NOSSOS PARQUES DE VOLTA!

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Por estes dias…

Eu fui às manifestações. Eu vou às manifestações. Faço a minha parte. Mas estas palavras não me saem da cabeça:

Não há português nenhum que não se sinta culpado de qualquer coisa, não é filho? Todos temos culpas no cartório, foi isso que te ensinaram, não é verdade? Esta merda não anda porque a malta, pá, a malta não quer que esta merda ande, tenho dito. A culpa é de todos, a culpa não é de ninguém, não é isto verdade? Quer-se dizer, há culpa de todos em geral e não há culpa de ninguém em particular! Somos todos muita bons no fundo, né? Somos todos uma nação de pecadores e de vendidos, né? Somos todos, ou anti-comunistas ou anti-faxistas, estas coisas até já nem querem dizer nada, ismos para aqui, ismos para acolá, as palavras é só bolinhas de sabão, parole parole parole e o Zé é que se lixa, cá o pintas é sempre o mexilhão, eu quero lá saber deste paleio vou mas é ao futebol, pronto, viva o Porto, viva o Benfica! Lourosa! Lourosa! Marrazes! Marrazes! Fora o arbitro, gatuno! Qual gatuno, qual caralho! Razão tinha o Tonico de Bastos para se entreter, né filho? Entretém-te filho, com as tuas viúvas e as tuas órfãs que o teu delegado sindical vai tratando da saúde aos administradores, entretém-te, que o ministro do trabalho trata da saúde aos delegados sindicais, entretém-te filho, que a oposição parlamentar trata da saúde ao ministro do trabalho, entretém-te, que o Eanes trata da saúde à oposição parlamentar, entretém-te, que o FMI trata da saúde ao Eanes, entretém-te filho e vai para a cama descansado que há milhares de gajos inteligentes a pensar em tudo neste mesmo instante, enquanto tu adormeces a não pensar em nada, milhares e milhares de tipos inteligentes e poderosos com computadores, redes de policia secreta, telefones, carros de assalto, exércitos inteiros, congressos universitários, eu sei lá! Podes estar descansado que o Teng Hsiao-ping está a tratar de ti com o Jimmy Carter, o Brezhnev está a tratar de ti com o João Paulo II, tudo corre bem, a ver quem se vai abotoar com os 25 tostões de riqueza que tu vais produzir amanhã nas tuas oito horas. A ver quem vai ser capaz de convencer de que a culpa é tua e só tua se o teu salário perde valor todos os dias, ou de te convencer de que a culpa é só tua se o teu poder de compra é como o rio de S. Pedro de Moel que se some nas areias em plena praia, ali a 10 metros do mar em maré cheia e nunca consegue desaguar de maneira que se possa dizer: porra, finalmente o rio desaguou! Vão te convencer de que a culpa é tua e tu sem culpa nenhuma, tens tu a ver, tens tu a ver com isso, não é filho? Cada um que se vá safando como puder, é mesmo assim, não é? Tu fazes como os outros, fazes o que tens a fazer, votas à esquerda moderada nas sindicais, votas no centro moderado nas deputais, e votas na direita moderada nas presidenciais! Que mais querem eles, que lhe ofereças a Europa no natal?! Era o que faltava! É assim mesmo, julgam que te levam de mercedes, ora toma, para safado, safado e meio, né filho? Nem para a frente nem para trás e eles que tratem do resto, os gatunos, que são pagos para isso, né? Claro! Que se lixem as alternativas, para trabalho já me chega. Entretém-te meu anjinho, entretém-te, que eles são inteligentes, eles ajudam, eles emprestam, eles decidem por ti, decidem tudo por ti, se hás-de construir barcos para a Polónia ou cabeças de alfinete para a Suécia, se hás-de plantar tomate para o Canada ou eucaliptos para o Japão, descansa que eles tratam disso, se hás-de comer bacalhau só nos anos bissextos ou hás-de beber vinho sintético de Alguidares-de-Baixo! Descansa, não penses em mais nada, que até neste país de pelintras se acho normal haver mãos desempregadas e se acha inevitável haver terras por cultivar! Descontrai baby, come on descontrai, afinfa-lhe o Bruce Lee, afinfa-lhe a macrobiótica, o biorritmo, o hoscópio, dois ou três ovniologistas, um gigante da ilha de Páscoa e uma Grace do Mónaco de vez em quando para dar as boas festas às criancinhas! Piramiza filho, piramiza, antes que os chatos fujam todos para o Egipto, que assim é que tu te fazes um homenzinho e até já pagas multa se não fores ao recenseamento. Pois pá, isto é um país de analfabetos, pá! Dá-lhe no Travolta, dá-lhe no disco-sound, dá-lhe no pop-chula, pop-chula pop-chula, iehh iehh, J. Pimenta forever! Quanto menos souberes a quantas andas melhor para ti, não te chega para o bife? Antes no talho do que na farmácia; não te chega para a farmácia? Antes na farmácia do que no tribunal; não te chega para o tribunal? Antes a multa do que a morte; não te chega para o cangalheiro? Antes para a cova do que para não sei quem que há-de vir, cabrões de vindouros, ah? Sempre a merda do futuro, a merda do futuro, e eu ah? Que é que eu ando aqui a fazer? Digam lá, e eu? José Mário Branco, 37 anos, isto é que é uma porra, anda aqui um gajo cheio de boas intenções, a pregar aos peixinhos, a arriscar o pêlo, e depois? É só porrada e mal viver é? O menino é mal criado, o menino é ‘pequeno burguês’, o menino pertence a uma classe sem futuro histórico… Eu sou parvo ou quê? Quero ser feliz porra, quero ser feliz agora, que se foda o futuro, que se foda o progresso, mais vale só do que mal acompanhado, vá mandem-me lavar as mãos antes de ir para a mesa, filhos da puta de progressistas do caralho da revolução que vos foda a todos! Deixem-me em paz porra, deixem-me em paz e sossego, não me emprenhem mais pelos ouvidos caralho, não há paciência, não há paciência, deixem-me em paz caralho, saiam daqui, deixem-me sozinho, só um minuto, vão vender jornais e governos e greves e sindicatos e policias e generais para o raio que vos parta! Deixem-me sozinho, filhos da puta, deixem só um bocadinho, deixem-me só para sempre, tratem da vossa vida que eu trato da minha, pronto, já chega, sossego porra, silêncio porra, deixem-me só, deixem-me só, deixem-me só, deixem-me morrer descansado. Eu quero lá saber do Artur Agostinho e do Humberto Delgado, eu quero lá saber do Benfica e do bispo do Porto, eu quero se lixe o 13 de Maio e o 5 de Outubro e o Melo Antunes e a rainha de Inglaterra e o Santiago Carrilho e a Vera Lagoa, deixem-me só porra, rua, larguem-me, desopila o fígado, arreda, T’arrenego Satanás, filhos da puta. Eu quero morrer sozinho ouviram? Eu quero morrer, eu quero que se foda o FMI, eu quero lá saber do FMI, eu quero que o FMI se foda, eu quero lá saber que o FMI me foda a mim, eu vou mas é votar no Pinheiro de Azevedo se eu tornar a ir para o hospital, pronto, bardamerda o FMI, o FMI é só um pretexto vosso seus cabrões, o FMI não existe, o FMI nunca aterrou na Portela coisa nenhuma, o FMI é uma finta vossa para virem para aqui com esse paleio, rua, desandem daqui para fora, a culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa, oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe…
José Mário Branco, FMI (transcrição daqui)

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Não quero contribuir em nada para a banalização deste momento histórico que o José Mário Branco criou em 1979 e partilhou uns anos depois. Mas o momento de partilhar e pensar é este.

Dia 13 de Outubro há manifestações culturais em várias cidades do país. Eu vou estar na minha cidade, Aveiro, e vou tocar algo que é muito especial para mim. Fazer o meu trabalho, portanto.

E vocês?

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Diz-me com quem queres andar…

Eu não sou adepto de ditados populares, mais que não seja porque há mais do que um para todas as ocasiões e, normalmente são contraditórios. Mas, quando comecei a pensar no assunto que me leva a escrever, ocorreu-me, para o título, uma corruptela do famoso “diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és”.

Isto a propósito de um aspecto que me parece ser fundamental para a relativa falta de saúde do debate político que se faz aqui por Aveiro. Há bastante tempo que a irrelevância que Aveiro assumiu no contexto nacional me faz confusão: com certeza que coexistem factores de várias origens que se relacionam de formas complexas para que assim seja, mas, em boa verdade, a cidade de Aveiro desqualificou-se e foi desqualificada no plano institucional, mediático, social, cultural e económico, de forma mais ou menos contínua nos últimos anos e não parece existir grande vontade, por parte dos protagonistas políticos, de inverter esta tendência. É como se houvesse um acordo de cavalheiros relativamente à reduzida importância da cidade de Aveiro e, nesse acordo, participam políticos, órgãos de informação, agentes económicos e instituições da cidade que, sinceramente, nem sempre percebo o que ganham com o “encolhimento” da cidade.

Exemplos desse “encolhimento” aparecem na forma de decisões sobre infra-estruturas fundamentais, como os serviços de comboios prestados pela CP, a alteração da circulação na rede viária que nos estrangula em SCUTs, propostas absolutamente estapafúrdias de alteração de modelos de gestão do estacionamento, desinvestimento e despromoção em equipamentos culturais e serviços do estado central, intervenções urbanísticas criminosas, etc. Cada um de nós sente cada uma destas decisões (e outras) como agressões às legítimas expectativas de uma cidade que é, para lá da realidade, a soma dos nossos sonhos projectados. Cada um de nós sentirá também, e por isso mesmo, um grande desânimo e frustração ao ver como estas decisões são tomadas, sem grande discussão ou participação, sem que surjam vozes fortes a demonstrar pensamentos claros e articulados que nos permitam pensar que as coisas podiam acontecer de forma diferente.

O grau de interesse individual far-nos-á participar em discussões políticas diferentes na forma, no conteúdo e no local, da conversa de café ou da cadeira do barbeiro, às reuniões partidárias e Assembleias Municipais, passando por espaços de tertúlia, física mas também (e cada vez mais) virtual. Aí, no calor das discussões, o “encolhimento” da cidade torna-se paradoxalmente mais óbvio: com a cidade encolhida sobre si própria, encalhada entre falta de ambição e visão de alguns, conforto e auto-complacência de outros, e comiseração de muitos, as iniciativas esbarram com a falta de oxigénio de uma cidade “abafada” por um ciclo vicioso de “não há razões ou pontos de interesse na cidade, a cidade perde visibilidade política e mediática; a cidade não tem visibilidade política nem mediática, não se justifica criar razões ou pontos de interesse”.

O quadro que pinto pode ser excessivo no pessimismo, mas esta é a dinâmica espiral descendente a que assisto nos últimos 10 anos, desde que voltei a viver em Aveiro.

E, como disse, tenho pensado e falado sobre isso, mas ocorreu-me escrever algo mais, quando ouvi um argumento que vi atribuído ao Presidente da Câmara num artigo sobre a discussão da privatização da MoveAveiro na Assembleia Municipal. Um argumento que não vi ser discutido como um grave sintoma do estado a que chegou a cidade.

É o argumento de que, dos 300 e tal municípios que constituem a realidade nacional, apenas meia dúzia têm transportes colectivos públicos, sendo por isso quase um execício de arrogância ou irresponsabilidade achar que Aveiro pode estar nesse grupo mais restrito. São os outros que estão enganados?, terá perguntado Élio Maia.

Este é um argumento “espertalhaço” porque apela à má consciência do povo desgraçadinho e invejoso que gostamos de ser. Mas eu, pessoalmente, preferia que Aveiro, no discurso político e na ambição urbana, evitasse comparar-se com a realidade dos 300 e poucos municípios portuguese e assumisse a ambição de fazer parte de alguns subconjuntos dos mesmos. Por exemplo, porque é que temos vergonha de assumir que estamos numa capital de distrito, que nos faria fazer parte de um grupo mais restrito de 18 cidades portuguesas em alguns dos nossos exercícios comparativos? Bem sei que o título de “capital de distrito”, em si mesmo, significa pouco, mas é um critério de comparação de cidades mais razoável do que o simples “município”. Municípios— lá está— há muitos, como os chapéus.

E se este critério não nos agradar, a cada momento, temos muitos outros critérios válidos para agrupar municípios, que podem ser úteis para uma forma mais corajosa e ambiciosa de pensar Aveiro: cidades com Universidades; cidades com linhas de comboio e paragem dos comboios Alfa e Intercidades; cidades do litoral centro/norte; etc, etc.

Se escolhermos um critério real— não uma daquelas filiações em redes fictícias, criadas para nos sentirmos menos mal— podemos todos subir as expectativas colectivas. E a exigência.

Porque não existe apenas a ambição cega e desmedida que nos trouxe à bancarrota, ou a timidez provinciana que nos estagna. Não pode.